Não
deveria ter seguido aquele rato até a toca, mas Peter não nasceu para seguir
deveres. Lá dentro, sem perceber, entrou numa estranha tubulação e fora
engolido.
Um
segundo depois, quando pressionou a tampa do esgoto e, com a cabeça para fora,
viu os prédios a lhe engolir, teve ânsia. As buzinas o deixavam ainda mais tonto.
Vomitou. Vomitou e foi rapidamente multado por sujar a cidade. Tentou voar,
mas já não sabia. Resistente, levaram-no à delegacia.
Sem
saber explicar o que fazia nas tubulações de esgoto, e sem pai, mãe ou advogado
a quem pudesse recorrer, Peter foi enjaulado com mais cem animais num quadrado
que cabiam dez. Estranhou não estar, ao menos, junto com as crianças desse
mundo. Desolado, passou a mão no queixo. Percebeu que ganhara barba e que as
horas corriam demais por aqui.
Saiu
da prisão no dia seguinte, já com sessenta e cinco anos. Sem nome, sem história,
um cachorro amigo e papelões nas costas. Dois segundos depois um garotinho o
estranhou pelas ruas.
-
Mãe, por que o velho de verde não para de bater os braços?
-
Não olhe, problema na cabeça.
-
Na cabeça?
-
Vamos!
-
Mas mãe...
Em
sua última olhada para trás, já distante, o menino viu o velho no tamanho de um
polegar. Fechou um dos olhos e colocou o dedo rente ao olho aberto, tapando por
completo a imagem de Peter. Quando retirou o dedo, o velho não estava mais lá.
Poderia jurar que voou. Jurou. Ideia criou raiz. Problema na cabeça. O menino não
cresceu. E viveu demais.
Cinco
dias após sua morte o garoto muito velho fora encontrado sozinho. Sem parentes,
sem ninguém, não houve reza nem velório, mas o manuscrito desta história
desencontrada, encontrado ao lado do corpo, tornou-se um grande clássico da
literatura moderna, esquecido, porém, pela geração seguinte, depois por outra, e por outra, e outra.