Há quem pense - e olha que não são poucos! - que “Romances” são apenas lindas histórias de amor, que “Novelas” são dramaturgias televisivas da Rede Globo ou da mexicana Televisa, e mais, que “Contos” são aquelas estorietas que lançamos mão no boteco para exaltar algum acontecimento narrativo digno de ser contado com uma cerveja na mão e uma rodela de calabresa no palito...
Pois bem, são tudo isso também, o que é justo e inegável, mas ao aplicarmos esses termos aos gêneros literários, mesmo aqueles leitores mais familiarizados com a literatura dita “canônica”, sofrem de uma insegurança tremenda ao tentar catalogar determinada ficção que, por ventura, cai em seus indagadores colos... Aqui vai um consolo: a insegurança, para não dizer “confusão”, é universalmente generalizada, e deixa até os mais renomados críticos de cabelo em pé! Vou elucidar um pouco a problemática, longe de tentar resolver esse “B.O” ou tomar qualquer partido nesse perigoso ninho de cobra.
O Romance moderno, gênero burguês por excelência, é herdeiro das grandes epopéias gregas e latinas, isso mesmo: Homero, Virgílio, Dante, Camões; e também das estórias medievais das cavalarias britânicas, aquelas da ilustre Corte do Rei Artur e sua gloriosa Távola Redonda... Costuma-se afirmar que Miguel de Cervantes, com o seu lendário “Dom Quixote”, seria o responsável pelo primeiro Romance moderno da história, ou seu mais significativo germe.
Com o fim da Monarquia, este gênero ficcional passou a cumprir a função de retratar o mundo e valores burgueses, sendo até chamado de “epopéia burguesa”. Poderíamos então classificar aqui (bem a grosso modo), que um Romance é:
- uma narrativa ficcional moderna e longa, com várias ações dramáticas e desenvolvimentos de personagens (Abrangente não?). Iríamos de “Dom Casmurro” e da “Metamorfose” até “O Senhor dos Anéis”, “Harry Porter” e “O Alquimista”? Será justo? Pois sim..., mas para esses casos não subestimem o poder dos “subgêneros”...
- Tudo bom, tudo quase bem, mas e a Novela?
Cervantes, tendo como referência o dinossáurico e revolucionário “Decamerão”, também seria o responsável pela consagração desse termo e gênero, com suas “Novelas Exemplares”, paridas ao mundo em 1613, quase duzentos anos depois das dez estórias de Bocaccio. As novelas seriam então narrativas mais curtas, tendendo a se desenrolar em torno de uma, ou poucas, ações dramáticas e personagens, ainda com a peculiar característica de “inacabamento”: aquela sensação de que a estória terá uma continuidade; talvez por isso, o termo “novela” se arrastou até as produções televisivas, já que não há nada mais peculiar do que o fim de um capítulo encerrado com esse “link” para o próximo (já repararam que o capítulo acaba quando o assassino aponta a arma ou quando a esposa encontra o galã pilantra com a amante em sua própria cama?)
- E o conto, conta logo!
Está certo, o “Conto”... Bem, o “Conto”, gênero muito difundido, praticado e estruturado pelo escritor Edgar Alan Poe, seria esse gênero ficcional de curtíssimo fôlego, com apenas uma ação dramática, até mesmo uma cena...
... Mas há quem diga que alguns contos são novelas, que algumas novelas são contos, e ainda esqueci de falar do “Petit Roman” (Pequeno Romance) que na França é o “Romance” que conhecemos hoje, mas que teve que ser reduzido, uma vez que “ nos tempos áureos da burguesia francesa” chegaram a escrever ficções de mil, duas mil, sei lá quantas intermináveis páginas... E se eu falar que esse Romance reduzido, por seu caráter de “novidade”, passou a ser chamado de “Nouvelle”, ou seja, “Novela”!!!
Não, não me mandem ir a lugares que eu não gostaria de estar... Enfim, o buraco dos gêneros literários é bem mais embaixo, e essas terminologias só servem mesmo para os críticos perderem os cabelos e os leitores se deliciarem de rir... Eu, que pouco me preocupo em me adequar aos gêneros e componho com o doce prazer de misturar e confundi-los, prefiro ficar com essas duas definições:
1ª (do escritor argentino “Julio Cortázar”, numa histórica conferência em Cuba):
Fazendo uma analogia com o boxe, ele diz algo parecido com: “O Romance é aquele que ganha por pontos, e o conto, por nocaute”. Aqui, ele se refere ao fato de o Conto ser um Romance “condensado”, “sintetizado”, com o poder de te arrebatar em poucas linhas. No Romance, esse arrebatamento se dá mais lentamente (colocaria a Novela aqui como uma luta onde se vence por nocaute bem nos assaltos intermediários - na metade da luta).
2ª (minha, em parceria com um crítico que não faço idéia agora quem seja):
“Você pega um livro de uma única narrativa ficcional escrita a partir do século XVI e o bota de pé: se cair, é Conto; se ficar parado, é Romance; se cambalear e cair, é Novela; se cambalear, mas insistir em não tombar, ah, chame-o de “Novelão” e estará tudo certo!”
Axé!
Simplesmente adorei sua definição final de conto, novela e romance. Muito bom! Ri demais... Adoto essa definição para mim agora!!
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