segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

BOA VIAGEM EM SETE ONDAS



        (em memória do mel, da lua e do mar de Pernambuco)


O seios de Iemanjá rebentam.

O leite que a onda traz
é o sangue quente do mar.

O leite derrete na veia,
o sangue espuma na areia,
transborda a retina
e contorna por cima do Olho
a orla da grande esmeralda:

todo o mar é o olho aberto de Oxalá.

E lá vem o vento,
corroendo a pedra,
redesenhando os cílios infinitamente;

lá vem, lá vem,
os lábios de Oyá criam desvios no tempo.

Oxum desce a montanha,
ourando de verde a cabeleira de Odé,
arrefecendo as espinhas de Xangô,
abraçando e recolhendo,
no pé,
água e sal para o Mundo gerar.

Olhe, Ogum também vem no ar!
Ogum corre sobre o mar,
Ogum vem cortando o mar
no ar...

- Com a licença , com a licença...

Na primeira eu deixo o remorso,
embrulho tudo o que posso
entre o desprezo e o rancor.

Na segunda descarto o cansaço,
enrolo a preguiça num laço
e mergulho mais fundo na dor.

- Que a dor é sim, minha Mãe,
o que trago de mais sincero,
sem reservas, sem mistério,
é quase tudo de mim.

Na terceira lanço o engano,
junto três tiras de pano,
amarro o erro e a deixo o levar.

Na quarta canto “Odoyá!”
levemente o medo passa
-  Oh, leve o medo, lave no mar...

Na quinta eu peço Amor,
a lembrança do que passou
e do mínimo que ficará.

- Que Amor, minha Mãe, é assim:
parece nunca ter fim,
mas se finda, o que lembrar?

Na sexta eu rogo saúde
pra mais viver sem me matar...

Na sétima onda, oh sim,
nessa eu vou me  banhar!

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